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quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Dona Flor

A beleza está nos olhos de quem vê. Ou pelo menos de quem sabe enxergá-la, não é verdade?
Dona Neusa andava pelas ruas do Bom Retiro sem pretensão alguma, com toda a serenidade peculiar de seus oitenta e poucos anos, muito bem vividos por sinal. Os passos lentos marcavam o chão como se fossem toques de pétalas, as quais seriam levemente rosadas se literais.
Em meio a tantas pessoas alvoroçadas pela rotina - e os loucos por sua consequência - o caminhar da senhora despertou minha atenção e a de alguns colegas em um dia de filmagens para nosso documentário acadêmico.
" Essas pessoas passam e nem te olham. Pior que isso, querem passar por cima de você, sem pedir licença alguma", se indignou.
Claro que me virei para reparar na dona de voz trêmula, e quando o fiz, notei uma pureza semelhante a da criança que ainda não teve a (in)felicidade de conhecer o mundo.
A verdade é que todas as décadas vividas por dona Neusa não lhe renderam uma explicação sensata sobre o mundo e as pessoas que nele vivem. Mesmo assim, a esperança cansada na humanidade ainda brotava no fundo de seus olhos, clareados pela idade (ou talvez pelas imagens que já viram).
A conversa se desenrolou com facilidade. É fácil se interessar pela vida de quem ama viver. Assim dá vontade de viver também.
Meu encontro com dona Neusa já faz quatro dias e eu ainda não parei de pensar em sua doçura. Havia mais confeitaria nela do que em qualquer doceria da cidade. O cabelo branco, as bochechas avermelhadas pelo rouge e o óculos de grau combinavam perfeitamente com as sacolinhas, os passinhos e o lindo dia que fazia.
Espero revê-la em breve.

ps - A propósito, a minha vó adorou seu presente. Acho que vocês sabem muito de todas as coisas.

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